Estou cego sem limite
E o que me embaça a vista 
Não é a crista da onda azul 
É o sinal vermelho dos dias 
O minuto de silêncio tardio 
O CD arranhado pelo pêlo arrepiado 
(O botão que descosturou da camisa branca). 

Estou cego 
E meu limite é o tempo e o espaço 
O embaraço de quando tento dizer 
Que o que eu digo é tão somente 
O que muitos dizem sem saber. 

Sim, minha cegueira é minha visão 
E minha visão me compreende por completo 
Mas não sou um livro aberto 
Para os que estão na sala e não veem o quarto. 

Estou cego no limite 
Entre o tangível e o abstrato 
Entre o grito de gozo e o pacto com o diabo 

(e o diabo e deus sou eu rimado). 

Sou criatura que nem quer ser 
Sou a multidão decadente e entorpecida
Sou o que quer tanto a vida 
Que de hora em hora se (en)torna suicida. 

Estou cego enfim 
E nada justifica o que não vejo 
Nada é o que quero quando não sinto: 
- Nada é a forma solidária que escolhi.

(Vânderson Domingues, 2002)
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